sábado, 29 de outubro de 2011

DAIMONES

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Daímones (em grego, singular: Δαίμων, “Espírito”, e plural: Δαίμονες, “Espíritos”) são as mais antigas divindades na mitologia grega, filhos de Nýx, por si mesma, representam o poder indomável e inflexível que nenhum deus poderia conter, geralmente poderiam ser representados como terríveis criaturas aladas e escuras, por isso são chamados de Filhos Negros da noite, são inúmeras divindades menores que afetam o corpo, a mente e o coração dos deuses e dos homens, em resumo, tudo quanto havia de doloroso na vida não passava de uma obra de Nýx.
Os Daímones personificam o "poder", o "divino", "gênio", "espírito", logoi spermatikoi, "palavra semeada", dentro da mitologia e da religião grega. Representavam a condição humana, as personificações de diversos estados de existência, emoções, ações, moral e ética, as energias interiores que atuam no homem, como uma espécie de voz da consciência. Esses Daímones morais eram divididos em Agathos ou Kakos e geralmente atuavam como mensageiros e intermediadores entre os Theoí e os homens.
Nas primeiras Eras do homem, as Idades de Ouro e Prata, os mortais bem-aventurados se transformavam em Daímones após a morte, por sua vida justa e correta, e atuavam como protetores dos homens, eram chamados de Daímones Khrýseoi e Daímones Argýreoi.
Os Daímones designam as forças que regem os elementos naturais e fazem com que o mundo humano seja um mundo habitado pelo sobrenatural.
Os Daímones eram divididos em classes específicas:
v    Daímones Agathoi (Δαίμονες Άγαθοι, “espíritos bons”, das “virtudes” e da “benevolência”), os bons espíritos das virtudes, que acompanham os homens como seus guardiões durante toda a vida e se manifestam quando necessário, opostos aos Daímones Kakoi.
v    Daímones Kakoi (Δαίμονες Κακοι, “espíritos maus”, dos “vícios” e os do “malefício”), os maus espíritos dos vícios, que acompanham os homens como seus lados sombrios durante toda a vida e se manifestam por meio dos maus pensamentos e das más ações, opostos aos Daímones Agathoi.
v    Daímones Khrýseoi (Δαίμονες Χρύσεοι, “Espíritos dourados”, também chamados de Δαίμονες Ἁγνοι, “espíritos puros”, ou de Έπχθονιοι, “acima da terra”), os espíritos bem-aventurados da Idade de Ouro, eram trinta mil espíritos habitantes dos céus, que vigiavam os atos dos homens e recompensavam os justos com prosperidade agrícola.
v    Daímones Argýreoi, (Δαίμονες Άργύρεοι, “Espíritos prateados” também chamados de Δαίμονες Μακαροι, “espíritos abençoados”, ou de Ὑπερχθονιοι, “abaixo da terra”), os espíritos bem-aventurados da Idade de Prata, eram espíritos habitantes das profundezas da terra, que vigiavam os atos dos homens e recompensavam os justos com prosperidade agrícola.
v    Daímones Ouranioi (Δαίμονες Όυρανιοι, “espíritos celestes”), um grupo de espíritos naturais do ar que habitavam os céus e estavam sob o domínio dos Theoí Ouranioi;
v    Daímones Halioi (Δαίμονες Ἁλιοι, “espíritos marinhos”), um grupo de espíritos naturais das águas que habitavam os mares e estavam sob o domínio dos Theoí Halioi;
v    Daímones Khthonioi (Δαίμονες Χθονιοι, “espíritos subterrâneos”), um grupo de espíritos naturais das profundezas da terra que habitavam o reino dos mortos e estavam sob o domínio dos Theoí Khthonioi;
v    Daímones Gêorgikoi (Δαίμονες Γηοργικοι, “espíritos agrícolas”), um grupo de espíritos naturais da terra e das áreas agrícolas, que habitavam os campos cultivados e estavam sob o domínio dos Theoí Gêorgikoi;
v    Daímones Nomioi (Δαίμονες Νομιοι, “espíritos rústicos”), um grupo de espíritos naturais das terras selvagens e desabitadas, que habitavam as áreas rústicas e estavam sob o domínio dos Theoí Nomioi;
v    Daímones Polikoi (Δαίμονες Πολικοι, “espíritos cívicos”), um grupo de espíritos naturais das Cidades e Estados, que habitavam as áreas urbanas e estavam sob o domínio dos Theoí Polikoi.

Daímôn Cretense

Existe uma série de imagens que aparecem em gemas e impressões de selos onde se vê dois animais ou bestas simetricamente colocadas a cada lado de uma figura central. Em certos casos, no lugar destes animais saem muitas vezes gênios teriomórficos, que viriam a ser os Daímones, mas a figura central pode ser também um desses demônios em ato de dominar as bestas. A figura tem forma de animal, mas está de pé, como um homem; não há duvida alguma de que se trata de una figura humana disfarçada. La cabeça e as pernas são as de um animal, mas parece impossível afirmar de que espécie. Convém abster-se da descrição comum de “demônios leoninos”. Um traço típico e diferente é o que parece ser uma pele solta ou outro tipo de manto que descende desde a cabeça até mais abaixo da cintura, e que sugere o corpo de uma vespa. Esse manto tem freqüentemente desenhos e uma crista de farpados ou pelos com uma pastilha no extremo. Salvo variações pequenas e pouco importantes, o tipo é fixo. Esses demônios aparecem como serventes dos Theoí, com jarras de libação e outras vasilhas nas mãos: regam os ramos sagradas. Algumas vezes, arrastam animais mortos, possivelmente para um sacrifício.
A difusão puramente formal de motivos gravados ou pintados, mencionada mais acima, em nenhum caso é tão persistente como em relação às fantásticas criaturas híbridas. A partir desses demônios e das figuras do Grýphes e da Sphýx, copiadas de Oriente, a arte cretense criou toda uma série de fantásticas combinações de membros e partes do corpo de homens e animais. Impressas de selo, de Zakros, apresentam uma multicolorida coleção dessas criações, de uma fantasia totalmente desorbitada; parecem ter sua origem na febril imaginação de uma mente exaltada e não se corresponde com nada parecido no resto do mundo. Naturalmente, não possuem nenhuma significação religiosa.
A uniformidade do tipo se revela na comparação com as poucas representações de outros gênios teriomórficos. Uma concha esculpida, de Phaistos, que sem dúvida revela influência babilônica, apresenta uma procissão de quatro figuras com cabeça de animal e longas vestimentas; as três primeiras tem cabeças de mamíferos, a última, de pássaro. Uma impressão de selo, de Zakros, parece interessante. Uma mulher com os braços no alto está parada diante de uma figura com forma de animal, sentada no solo como um cão e também com os braços no alto. O problema consiste em saber qual é o adorador e qual o adorado. Ainda mais interessante parece a chamada impressão de selo do Minotauros, de Knossos. Sobre um banco dobradiço, está sentada una criatura com pernas e troncos humanos, mas com cascos, cauda e a cabeça sem cornos do que parece ser um bezerro; diante dele há um homem com os braços caídos: não se trata, então, de um adorador. Desta misteriosa imagem depende na verdade a questão de si existia um culto do touro em Krete, tal como foi freqüentemente sob a influência dos mitos sobre Europe e o Minotauros. A pesar de que muitas vezes aparecem representações de lutas e caçadas de touros, não existe o menor indício de que possuam significações religiosas. Faz falta uma evidência mais concreta.

Daímôn Micênico

No segundo milênio, os gregos emigraram ao território que seria seu e se estabeleceram entre os povos nativos. Estes não desapareceram, senão que se misturaram com o povo grego. Foi-se discutido si os amos das fortalezas micênicas do continente eram colonos de Krete ou, segundo Martin Persson Nilsson, gregos que adotaram a cultura cretense. No último caso, junto com a cultura deveriam adotar em muito ampla escala a religião cretense: si a primeira hipótese é a acertada, a influência dos senhores cretenses sobre o povo grego, cometido e pouco desenvolvido, devia ser ainda maior, e não no último termo na ordem religiosa.
Grécia contribuiu ao dar a crença dos Daímones, que degeneraram em feitiçaria e superstição ao espalhar-se na Ásia.
Daímôn na natureza
Daímôn era a idéia grega de “poder”, que foi deslocada pelo antropomorfismo, vigorosamente desenvolvido, que também transformou “os poderes”. Os gregos chamaram de Daímones aos últimos, mas, em grande parte, os Daímones parecem pessoais, antropomórficos; além disso, a palavra Daímôn pode indicar a alguns dos grandes Hellênikes Theoí. Traços demoníacos nos ritos são sumamente raros, mas o intercambio de roupas entre o noivo e a noiva ao casar-se poderia interpretar-se dessa maneira: a idéia poderia ser a de induzir o erro aos espíritos nessa importante ocasião, da mesma maneira que os povos primitivos mudavam as roupas de um enfermo para que os espíritos da enfermidade não pudessem reconhecê-lo e passem longe. A crença em Daímones enraíza a idéia de que o mundo está povoado destes espíritos. Os Daimones vivem nos desertos, entre as montanhas, na selva, nas pedras, nas árvores, na água, nos rios e mananciais; são os que ocasionam tudo referente ao homem; enviam prosperidade e miséria, sorte e desgraça. São eles os que deram origem a antiga afirmação de que "o medo criou aos Theoí", pois o homem se sente muito mais consciente da interferência dos poderes superiores em sua vida quando se enfrenta com as desgraças do que quando as coisas seguem seu curso normal. Como conseqüência necessária dessa idéia, o objeto do culto mais primitivo, de uma maneira ou outra, deve manter os poderes afastados da vida: é um objeto apotropáico, uma proteção contra o mal. Este enfoque da religião e culto grego ignora a magia ou a considera prejudicial, mas, em sua etapa primitiva, a mesma, possuí uma função muito distinta. Por meio dos ritos mágicos, os homens tratam de assegurar fertilidade e prosperidade para si e para os demais; a magia está a serviço do bem-estar individual e do bem-estar social. Revela-se assim a intenção mais elevada da religião: está dirigida, sob a forma de magia, ao bem geral.
Um rito mágico faz referência ao “poder” em geral, mas este mesmo pode ser deslocado pelos “poderes” ou por um “poder” determinado, e já estamos aqui ante a primeira etapa que leva até os Theoí. No totemismo, ao cumprir certos ritos, por exemplo, para a multiplicação do animal totêm, o indivíduo acredita que seu êxito depende do favor do ser totêmico primordial; neste caso, poderia nascer um deus com forma de animal. Parece que isto ocorreu em alguns casos, mas parece desnecessário estudar esta possibilidade no que se refere a Grécia. Entre os ritos agrários, existem exemplos mais seguros e mais evidentes.

No culto a Deméter

Os espíritos vegetais pertencem a um dos capítulos melhor conhecidos do folclore europeu e das religiões não européias. O “poder” que se expressa na folhagem verde das árvores e nas espigas dos campos resulta fragmentado em “poderes”, que tomam a forma de um animal ou de um homem. Além dos ritos puramente mágicos onde está implícito o “poder”, aos que aludimos antes, aparecem outros que implicam na existência “dos poderes”; em um começo, o homem não chega a estes últimos através da oração e do sacrifício: está tão possuído pela idéia mágica de que o semelhante produz o semelhante, que, para promover o crescimento e o aumento da vegetação, cumpre certos atos com as representações e imagens dos espíritos vegetais. Uma idéia que aparece com freqüência é a de que deve-se capturar e matar, na colheita, ao espírito vegetal com forma animal ou humana. O mito de Litierses se explica desta maneira, mas é mais frígio que grego. Nas Karneai, festival da colheita em Sparte, jovens que levavam ramas de videira disputavam uma corrida; o chefe estava adornado com fitas, e si os demais o alcançavam o feito era considerado de bom augúrio. Wide  deduziu, segundo certos indícios, que esse jovem substituía a um carneiro. Um costume semelhante se observava nas Oskophoriai, em Athenai. Neste caso, a interpretação depende totalmente do alcance que queiramos adjudicar aos paralelismos que aparecem nos costumes da colheita da Europa moderna. Um costume de Magnésia, sobre o Maiandros, fala com maior certeza. Ao iniciar-se o plantio, se comprava um touro que se dedicava a Zeus Sosýpolis. O alimentava as despesas da comunidade, e a todo aquele que traficava no mercado se assegurava que ao proporcionar-lhe comida realizava uma boa ação. O sacrificava em um momento que coincidia com a colheita, e todos que haviam tomado parte no festival compartilhavam a carne. É incontestável que esse touro personifica a safra em pé, entre a época do plantio e da colheita, e que seu sacrifício constitui uma comunhão com o espírito vegetal. Este costume assegura para o curioso rito das Bouphoniai, em Athenai e outras cidades jônicas, uma explicação semelhante, tal como já muito se propôs. Se matava um boi de labor com cerimônias que indicam que o sacrifício se sentia como coisa ilegal. Recheava-se logo a pele, se colocava diante do arado, e os concorrentes ao festival comiam a carne.
Nestes casos, o espírito da vegetação aparece com a forma de um animal. Pode apresentar-se também com forma humana, e isto ocorre em um ritual da colheita, que tem importância muito maior, porque deu origem a uma das grandes divindades da Grécia. Sabe-se muito bem que o espírito de las safras está representado pelas últimas espigas colhidas, e que freqüentemente era imaginado com forma humana como a Mãe das Safras. A Mãe das Safras grega é Deméter, cujo mesmo nome talvez tenha esse sentido; no festival da colheita, sua imagem era levantada entre os montões de grão com um feixe e as papoulas do campo nas mãos. Esta interpretação tem sido discutida, mas está respaldada pelo fato de que, nos mistérios de Deméter em Elêusis, a colheita em silêncio de umas poucas espigas se considerava o rito mais sagrado. Nossa informação é de uma época posterior, mas está confirmada por uma pintura de vaso que mostra umas espigas em um templo. As espigas de cereais ocupavam um lugar no culto; por isso, a afirmação de que a deusa dos cereais teve sua origem nelas parece fundamentada. Existe uma longa série de epítetos de Deméter que se referem aos cereais, o feixe, a colheita, a debulha e os montões de grão. Ao cereal se chama “fruto de Deméter”, e é ela que separa o grão da palha. O gênio do feixe teve via livre para chegar a ser uma deusa, sem que o tenham travado em sua evolução idéias religiosas de ordem superior. Deméter estende sua proteção à agricultura em geral, cujos ritos chegaram a relacionar-se com ela. A mais antiga das fábulas sobre este tema, as núpcias da Theá com Iasios sobre um campo em alqueive, aparece mencionada em Homeros e constitui o disfarce mítico de um rito muito conhecido, em virtude da qual a procriação humana trata de suscitar a fertilidade dos campos. A magia vegetal das Tesmophoriai estava relacionada com Deméter; nos mistérios elêusinos, que tiveram origem em um festival agrícola, mudou-se a vida humana, por uma fácil analogia, a germinação e a decadência das safras e nasceu assim a expressão mais profunda do sentimento religioso grego. A filha da Theá é Khoré, “a donzela, a filha”. A filha da Mãe das Safras, a Jovem das Safras, como se chama algumas vezes na Europa moderna, ocupa seu lugar natural neste círculo de ritos e de idéias; é a nova colheita futura, mas há entrado em outro ciclo.

No culto a Hermes

No caso de Hermes, existe uma evolução semelhante. É um dos poucos nomes com uma clara etimologia; significa “o do montão de pedras”. Na Grécia existem diversos exemplos do culto da pedra. Na pedra havia um Daímôn; por isso era ungida, era envolvida em taeniae sagradas e era objeto de culto. O famoso omphalos (Oμφαλoς, “umbigo”) de Delphoi é uma pedra desse tipo; o mesmo ocorre com o pilar que era colocado em frente à casa e que a protegia. Apollôn se apoderou de ambos e deu seu nome ao último, Apollôn Agiaius. Uma grande pedra era levantada sobre por cima do túmulo sepulcral, que freqüentemente era formado por outras pedras menores. Era um costume muito difundido que todo aquele que passasse junto a um desses montões de pedras agregasse a ele a sua. Em um país sem caminhos, essas pedras podiam constituir marcos, e é provável que em sua origem nem todos fossem túmulos. Nesse montão e na grande pedra vivia um Daímôn. Como o conjunto constituía um marco, esse Daímôn se converteu em guia e protetor do viajante; como era também o túmulo de uma sepultura, resultou, além disso, num guia de almas, mostrando-lhes o caminho até seu reino; e como apareceu na Arkádia, terra de pastoreio, promoveu o aumento dos rebanhos e foi o patrono dos pastores. As funções do Daímôn se concentram, então, ao redor do marco e da grande pedra. Sua imagem, o herma, não era senão uma grande pedra erguida sobre um montão delas; desde um começo, essa pedra foi a morada do Daímôn; depois a considerou como sua imagem e lhe acrescentou uma cabeça humana. Não chegou a ser totalmente antropomórfica, mas seguiu protegendo os caminhos e as ruas e a colocou sobre as sepulturas. O conhecimento geral e popular sobre um tópico de Hermes Thrismegistos é uma fonte das duas para concepções pagãs e cristãs de demônios, pois no Corpus Hermeticum, funcionaram como os porteiros das esferas através das quais as almas passam de um caminho a outro até chegar ao céu mais alto, o Empíreo. O sacramento do Santo Gall, da Alta Idade Média, dá testemunho da continuidade desta crença de Daímones na oração existente mais velha para ungir ao moribundo:
“Lhe unjo com azeite santificado que a maneira de um guerreiro preparando-se para a batalha se unge minuciosamente vós podereis prevalecer sobre as hordas aéreas".
Nesses dois exemplos se pode investigar como um Theós teve origem na crença em um poder demoníaco e no rito correspondente. Mas, todavia nos permanece um problema de importância fundamental. Todo campo possui um último feixe e uma mãe das safras; todo montão de pedras tem em si um Daímôn que vive e obra. Desta multiplicidade, como nasce a unidade; ou seja, uma mãe das safras, que protege todos os campos, e um deus dos montões de pedras, que vive em todo ele? Os processos diferem um pouco em ambos os casos. Todos os anos, reaparecia o ritual da colheita e, com ele, a mãe das safras: a fecundidade de um ano provinha da do ano anterior, e a mesma mãe das safras voltava todos os anos, da mesma maneira que o sol sai todos os dias. De igual maneira, as mães das safras dos diferentes campos se viram obrigadas a coincidir, assim como o nome era o mesmo. Não havia nada que pudesse mantê-las separadas: os cultivos mudavam de terra todos os anos em virtude do sistema de duplo campo. Por outra parte, o espírito do marco estava localizado no determinado montão de pedras em que vivia. Também neste caso, o nome comum produziu o descobrimento do mesmo espírito em todos eles; mas pode produzir-se também outro tipo de evolução: que cada espírito, localizado em seu montão, se convertesse em um deus em pequena escala. Deidades de este tipo, menores e locais, são bastante comuns na Grécia.

Divisão dos Daímones

Os Daímones da natureza constituem o grupo mais numeroso. Aparecem em todas as partes: as Nýmhpai vivem nas montanhas e também nas árvores, mananciais, rios e mares; os Seilenoi são Daímones das fontes e, junto com os Satýroi, constituem Daímones da fertilidade; os Panes são da mesma natureza e o fato de terem nascido entre povos pastores lhes proporciona um caráter especial; os Kentáuroi pertencem também a esta categoria, ainda que apareçam sobre tudo na mitologia. A natureza está cheia destes Daímones; são inumeráveis, já que cada manancial, cada árvore, cada objeto natural, tem ou ao menos pode ter o seu. Daí que surgem multidões de Daímones da natureza de distintos tipos. Dentro de cada grupo homogêneo, o individual desaparece no conjunto; o Daímôn que reside em um determinado objeto natural possui um círculo de adoradores sumamente limitado; a maior parte não possuíam culto, senão que existiam somente na crença e na imaginação. Em outros campos, também aparecem grupos coletivos de espíritos ou deuses, semelhantes aos anteriores, como “os Doces Theoí” (Ζεοί Μειλίχιοι), “os Turbulentos” (Μαιμακτηρες), “as Theaí do Nascimento” (Έιλειθυιαι), “as Veneráveis Theaí” (Δεμναί Ζεαί), e os “Chefes” (̉Άνακες), os filhos de Zeus, os Dioskouroi.
Estes espíritos intervêm na vida e na sorte dos seres humanos. Os homens se voltam para eles em busca de paz, felicidade e prosperidade. Assim como o ritual da colheita não podia abarcar todas as safras do campo e se elegia um feixe que representasse ao conjunto, tampouco o culto podia dirigir-se ao grupo coletivo. A atenção fixava sobre um espírito determinado entre uma multidão de outros similares. Si tem um lugar fixo, se elege o mais próximo; nasce então um Theós local. Si a localização não constitui um traço notável, o singular ocupava simplesmente o lugar da pluralidade: em lugar dos Panes, se invoca a Pan. Parece significativo que em um documento tão recente como o registro do festival secular do imperador Augustus, as Ilitías apareçam em plural, exceto na invocação, onde se lê: “Oh tu, Eileithýia!” Em uma caverna dedicada ao culto das Nýmphai na Áttika, onde se gravaram várias inscrições no século V a. C., se fala das Nýmphai sempre em plural, exceto uma dedicatória que diz:
Arkhedemos o construiu para a Nýmphe”.
Na vida humana
O homem comum por suas necessidades criou aos Theoí. Elege a um dos “Poderes” ou Daímones que habitam em sua imaginação e se dirige a ele para induzi-lo a satisfazer seus requerimentos, sendo o culto a expressão dessa necessidade. Um Theós é um Daímôn que adquiriu importância e fixou sua forma através do culto. Dentre uma multidão de seres semelhantes, o culto elege um como objeto, e este se converte em um Theós individual. Mas sobrevive a crença em numerosos Daímones e, si o espírito concebe simultaneamente ambas as coisas, estes últimos adquirem um chefe. Por isso aparecem Pan e os Panes, Seilenos e os Seilenoi, ainda que Seilenos se reduziu a uma figura semi-cômica quando seus acompanhantes passaram a integrar o séquito de Dionýsos. Ártemis é uma grande Theá que parece ter nascido desta maneira. Em essência, não é senão a mais notável das Nýmphai dos bosques e das montanhas. Vai à caça e dança com elas pelas montanhas, as selvas e os verdes prados. Como elas, maneja os animais na natureza virgem e alimenta a seus cachorros. Como elas, estende sua influência até os homens: ajuda as mães no momento de suprema necessidade e protege a geração que nasce, mas pode também repartir uma morte violenta com seus dardos. Essa tendência a exaltar até um lugar supremo a um de muitos seres semelhantes estava tão enraizada, que deixou um exemplo correspondente a época de transição até a fé cristã. Os “Theoí selvagens” lícios eram representados por doze figuras semelhantes; se agregou uma décima terceira como chefe, colocando no centro e de tamanho um pouco maior, mas igual ao resto no demais.

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